Merkel’s trump: a autofagia europeia numa geringonça moderna

(artigo publicado no Semanário SOL - 25 de novembro de 2017)

A Alemanha é reconhecidamente um dos principais motores da Europa, mas pode estar neste momento numa encruzilhada em que ela própria se colocou. A indecisão de um novo governo alemão pode por isso mesmo não ter apenas impacto na Alemanha, mas também repercussões no futuro da própria Europa.
Longe vão os tempos de chanceleres mobilizadores como Helmut Kohl e, ainda mais longe, os tempos de chanceleres visionários como Konrad Adenauer.
Angela Merkel é uma reconhecida “jogadora de tabuleiro”, que tem sido eficaz na gestão política radical do status quo europeu e alemão, isto é, tem garantido um controlo total e imobilizador de toda a política europeia, não cedendo nessa sua estratégia principal. 
O problema é que tudo isso, tal como em qualquer produto empresarial, tem um tempo de vida. As eleições alemãs traduziram que, provavelmente o produto Merkel, estará no início do seu declínio. O partido SPD, segundo maior partido e seu parceiro de coligação nestes últimos anos, apesar de ter como líder Martin Schulz, que também não deixou grandes recordações como líder do Parlamento Europeu, compreendeu que foi arrastado para um mau resultado eleitoral por essa fusão governamental com o partido democrata-cristão (CDU) de Merkel, bem como a perceção desse declínio provável da chanceler alemã, concluindo estrategicamente não manter o “bloco central” de governação. Governação esta que demonstrou incapacidade de criar visões e esperanças. Estes últimos quatro anos em particular, demonstrou querer ter uma sociedade seguidora de uma liderança estacionária, abrindo espaço para posições mais demagógicas de partidos como o AfD, que num ápice entrou para o parlamento alemão como terceira força política.
Merkel, certamente inteligente como demonstra ser, compreenderá certamente o fim anunciado, mas ainda tinha o seu trunfo (trump) para aumentar a sua vida no topo da política e status quo alemão e europeu: criar uma salada de frutas, “a la Geringonça”, com partidos que não se terão iludidos com o acesso imediato ao poder.
As próximas semanas serão de asfixia provável de Angela Merkel, apesar de na política não se poder dar sentenças de morte a ninguém. Todos estão a prever que a sua presa está ferida, pelo que o acelerar do ataque e radicalismo de discurso irão aumentar. 
Na política, como na vida, aplica-se o ditado popular “fazes a cama em que te deitas” e que reflete bem o que se está a passar na Alemanha. O problema é que essa cama de fraca visão e autofágica da Alemanha para a Europa no mundo, abriu um espaço para incompetentes, demagógicos e nacionalistas. 
E … o desmoronar de uma Europa como um castelo de cartas continua. Cenas dos próximos capítulos desta queda continuarão já de seguida num país perto de si…



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