Itália: a Europa a caminhar para a psicanálise

Depois do Brexit da Grâ-Bretanha, da pré-independência da Catalunha, do penoso e longo impasse governativo da Alemanha, de outros percalços políticos e económicos da "anémica" União Europeia, o ano de 2018 inicia-se com um calafrio transalpino. A Itália, 3ª economia da zona euro, no próximo dia 4 de março, irá criar mais algumas taquicardias e ansiedades nos centros de decisão europeus.

A confusão que se avizinha é tal, que neste momento há cenários para todos os gostos e feitios. E embora a Itália já há muitos anos nos habituou a mudanças governativas recorrentes, este ano a novidade está no peso das formas mais radicais. Este cenário ocorre fundamentalmente, porque aquele que era o salvador e orientador do país para a Europa, o antigo primeiro ministro Matteo Renzi, se revelou também ele ultrapassado pelos acontecimentos e sem capacidade de passar do discurso retórico à prática (provavelmente veremos Macron em França a passar pelo mesmo).

Explicando um pouco da "salada latina", que poderá ajudar a cavar um pouco mais o buraco que a Europa caminha atualmente, destaca-se pela ironia do destino italiano: o "super" Berlusconi que aos 81 anos, depois de cumprir pena por fraude fiscal e de estar inibido até 2019 de exercer cargos públicos, aparece como potencial decisor na estabilidade governativa, com o seu partido de centro-direita Forza Italia (FI) (qualquer semelhança num município perto de si será pura coincidência).

O Partido Democrático (PD) de centro-esquerda, do atual primeiro-ministro Paolo Gentiloni, degladia-se para ser o mais votado contra o anti-partido eurocético Movimento 5 Estrelas (M5S), mais conotado com a extrema esquerda, do conhecido ex-cómico Beppe Grillo, hoje liderado por Luigi di Maio. Por sinal, este anti-partido que era contra tudo, com o aproximar do poder, já veio recentemente dizer que "a saída do euro já não era prioritária para o partido" (qualquer semelhança com a realidade portuguesa será pura coincidência).

Mas há mais, a extrema direita da Liga do Norte (LI) e do Fratelli d'Italia (FdI) poderão alcançar em conjunto mais de 20% dos votos, isto é, também os radicais de direita poderão ser balanceadores de (ins)estabilidade governativa, ou manter o seu curso de médio longo prazo ganhando peso, com o seu discurso populista e radical, em próximas eleições.

A realidade política italiana é de facto confusa e sintomática do crescente radicalismo de forças extremistas de esquerda e de direita, tendo por base a indefinição em que se encontra a Europa. A Itália é mais um exemplo da necessidade da Europa fazer a sua psicanálise, para voltar à visão de uma Europa una, federada ou não, conforme os alicerces da sua fundação pelos inspiradores Jean Monnet e Robert Schuman. A não realização de uma reformulação do caminho, continuarão a florescer divisionismos e instabilidades nos países europeus, para satisfação dos outros pilares económicos e políticos mundiais. 

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